Meus.

Meus.

segunda-feira, 24 de maio de 2010

É tudo relativo.

Engraçado como acontece a vida. As oportunidades que surgem, as pessoas que a gente conhece, as coisas que fazemos, os lugares para onde vamos.

Angelina era dessas que não perceberia nada nem se a vida sapateasse em sua frente. Trabalhava numa empresa grande e tinha uma política severa de ''não se incomodar'', portanto mantinha-se à margem de todo e qualquer acontecimento. Não se incomodava, é fato, mas também não confraternizava, não se alegrava quando algum colega obtinha uma conquista e não esperava que alguém a felicitasse no dia de seu aniversário. Era uma vida tranquila, é verdade, sem os solavancos e eventuais tropeços que podem ocorrer. Não sofrera pela perda do Renato, da contabilidade, que morreu de repente, vítima de um latrocínio, sentiu algo, um frio na barriga pela proximidade da morte, mas não foi nada que lhe tenha tirado a vontade de comer ou de ir trabalhar, como aconteceu com a Cecília, com a Maria Emília e com a Fernanda, também da contabilidade. Vivia uma vida tranquila, e a seu ver um amor somente viria perturbar esse estado homeostático, portanto nunca envolveu-se com ninguém. Jamais sofrera como a faxineira Lídia, que ia trabalhar aos prantos quando brigava com Décio, seu 'amásio', nem nunca suspirou alto como a Natália, estagiária de administração, fazia ao ler os recadinhos apaixonados do João Henrique em seu orkut. Nunca fez um orkut, na verdade tinha medo da internet e de colocar até seu nome nas pastinhas da intranet. Vai saber quem vai ler o que escrevo, é o que pensava.

Já a Melissa, adorava relações. Conversava com todos, não ficava um final de semana em casa. No trabalho, na faculdade, supermercado ou no banco conseguia arranjar novos contatos, sempre em movimento e aberta a novas experiências. Consequentemente sofria mais do que Angelina. Chorava horrores, como a Lídia, pelo namorado da vez e sorria feito boba a cada encontro com um novo rapaz, romance era algo fundamental. Tinha algo em sua personalidade que era atrativo, sempre se interessava pelos outros, mas ao mesmo tempo era capaz de falar sobre si. Todos queriam contar suas novidades a ela que sempre parecia disposta a ouvir. Sempre que o filho da Carol, chefe de RH, fazia aniversário ou tinha uma apresentação um pouco mais importante, a Melissa ia e mais: fazia sucesso entre a criançada.

Engaçado isso, de diferentes atitudes, às vezes, nos levarem aos mesmos lugares. Ambas, Melissa e Angelina, foram transferidas de seus departamentos. Colocadas para trabalharem juntas. Os chefes acreditaram ser essa a única maneira de uma ajudar a outra a não ser despedida, pois ambas eram perfeitamente complementares.

terça-feira, 18 de maio de 2010

Especialmente

O diferente faz doer os olhos.
Por mais difícil que essa frase seja é a mais pura verdade. É complicado para qualquer um olhar pela primeira vez para uma diferença com total naturalidade, senão impossível. Comigo não foi o contrário, mas é impressionante como mudou minha visão de mundo depois que comecei a trabalhar com pessoas especiais. Absurdamente clichê ou não, passei a dar mais valor às coisas pequenas - como comer sozinha sem derrubar nada, ou me sentar de forma ereta só com o apoio de minha própria coluna - e desenvolvi muito minha paciência, já que não é possível apressar alguém que malmente mantém-se em pé, numa caminhada de 50m. Comemoro mais, também, cada pequena conquista como, por exemplo, as desse menino da caminhada mesmo, que ao terminar de comer sozinho nos pede beijo e carinho na cabeça.

O que antes berrava como diferente, agora soa como especial.
Sinto, a cada dia de trabalho, que nada do que eu os fizer será pouco. Suas famílias (quase todas, sempre há uma exceção) os amam intensamente, fazem tudo que lhes está ao alcance para prover conforto e estabilidade dentro de suas condições. São pais, mães, irmãos, tios e avós cansados, abatidos pelo sofrimento implícito nessas vidas, mas que têm brilhantes os olhos quando se fala neles, os especiais.

Não é a toa o termo, especial. São sim especiais, no sentido enobrecedor do termo, pois vivem à margem de todas as sociedades, convivem apenas com aqueles que se propõem a trabalhar com eles e com os iguais em condição, dependem inteiramente de cuidadores, são frágeis, frequentam os poucos locais munidos de acessibilidade, porém ainda assim mantêm um sorriso no rosto, quase que agradecendo qualquer pequeno contato conosco, os 'normais'.

Perto deles me sinto pequena, mas sempre saio de lá maior.

segunda-feira, 17 de maio de 2010

"Interculturalidades"

Há muito tempo atrás, uns 16 ou 17 anos, eu resolvi que ia aprender inglês.
Estava ouvindo um cd com musiquinhas infantis que meu pai trouxe do Paraguai e não gostava de não entender o que elas diziam. Sabia que minha mãe tinha um dicionário de inglês, de capa verde, que eu sempre achei super legal por que ela colocava datas na capa dele, de diversos acontecimentos da vida dela, tipo um diário - sei de onde puxei essa loucurinha meio poética que tenho - e perguntei se poderia emprestá-lo por um tempo. Claro que ela achou o máximo, mas no fundo percebi que não botou muita fé. Estava de férias, lógico que ela não botaria muita fé...
Porém, contrariando as probabilidades, nas próximas semanas dediquei-me ferrenhamente à tradução de todas as músicas daquele cd que, até hoje, aprecio.
Foi aí que começou meu facínio por idiomas.

Capa do tal cd


O mesmo resolvi fazer, há pouco tempo, uns 3 anos atrás, com o francês. Matriculei-me no Estadual, fiz um semestre e baixei um moooonte de musiquinhas.
Carla Bruni, Pink Martini, Yann Tiersen, Edith Piaf, entre outros, passaram a ser minha trilha sonora. Tenho orgulho de dizer que: "Le unique chose que je parle très bien on française, c'est que je ne parle pas!", que significa: "A única coisa que falo muito bem em francês é que eu não falo!".


Tive, também, uma incursão no fantástico mundo do alemão. Caramba, que loucura, sério! Os caras juntam 3 ou 4 palavras inglesas e formam uma só alemã! Fica aquelas coisas enormes e extremamente difíceis de falar, com trema, 'u' com som de 'i', 'v' com som de 'f'... Enfim, uma loucura que não rolou, mas rendeu uma fase de Rammstein que meus pais odiaram!!!!

Adoro idiomas, adoro isso de traduzir as coisas, entender a partir do contexto o que significa uma palavra ou outra, mas acima de tudo, adoro conversar com pessoas de outras culturas. Foram muito legais as vezes em que tive a oportunidade de conversar com extrangeiros.
Estive com americanos, no ano passado e nesse. Trabalhei, passeei e tive até uma paixonite aguda por um deles; consegui desmistificar um pouco a imagem péssima que eles têm do Rio de Janeiro, fazer com que perdessem o medo de irem pra lá sozinhos e mostrar que aqui não se tem apenas floresta, samba e 'boazudas' rebolando.
Falei ano passado com um par de atores uruguaios interessantíssimos, que largaram a carreira de publicitários para se tornarem artistas de rua e se deram muito bem, moraram na Cidade do México, em Quito, em Campinas e agora estão em São Paulo. Conversei por horas quando estiveram aqui pro festival de teatro e, um mês depois, quando fui pra São Paulo, encontrei um deles na Av. Paulista pra uma cerveja, duas mil histórias e muita risada.
Depois de sua apresentação falei com Francis Lebarbier, um francês, palhaço de carreira, idealizador de uma companhia chamada "Les Matapeste", que deu e dá voltas ao mundo divulgando seu trabalho, de forma tão sutil, diferente do nosso jeito brasileiro. Com um olhar perdido, mas atento ao mesmo tempo ele me ensinou sobre como os franceses olham. Com uma fala mansa, eu entendi tudo o que ele disse, pois falou manso justamente para que eu o entendesse. Ao tocar "Burguesinha", fez questão de - tentar - aprender a sambar e eu tentei ensiná-lo.

Não estou dizendo que todas as experiências foram 100% alegria, mas sem falar inglês, arranhar um francês e dar um jeito no espanhol (ah é, não mencionei o espanhol antes) não poderia comunicar-me diretamente com nenhuma dessas pessoas, teria que me limitar à tradução de algum outro, dependendo de sua fidedignidade e perdendo a essência da conversa.


A linguagem é uma das principais coisas que nos diferencia dos animais, a cultura é produto disso. Apreciar culturas, pra mim, é mágico! Treino tanto minhas 'línguas' pra isso, pra no fim, entender o que se passa na cabeça de alguém que mora a milhares de quilômetros de distância de mim sem ser de lá. Mesmo quando eu puder viajar para mil lugares diferentes, só entendendo o que se diz em cada um é que poderei dizer que, realmente, os conheço.

domingo, 16 de maio de 2010

No Rondon eu sofri.

Pelo calor excessivo, pelos mosquitos que fizeram a festa em minhas pernas, pela falta de sono, por ter que andar a pé e pelos horários de comer, que geralmente eram quando eu não tinha fome. Sofri também por ter tido que ouvir sertanejo e Djavu todos os dias e em todos os lugares, pela distância dos meu gatos e por não ter podido assistir meus programas de tv, porém todos esses sofrimentos juntos nem se comparam à tristeza de deixar tudo isso pra trás.
Fiz uma nova família, inseri-me em uma nova comunidade, participei de algo muito maior do que imaginei que seria. Fui para lá com a idéia de que o trabalho, as pessoas que eu iria conhecer e a diversão que teria seriam, de certa forma, superficiais já que passaríamos somente dezessete dias inseridos no projeto, porém não tinha noção de que tudo aconteceria com tamanha intensidade que marcaria minha vida para sempre. Nunca tive aulas de civilidade, nem venho de uma linhagem políticamente ativa, por isso acho que valorizo tanto essa experiência e, lógico, acredito piamente que aqueles que não desejam loucamente participar dela é louco de pedra.
Alguns chamam o Rondon de "curso intensivo de Brasil". Eu não concordo, acho essa afirmação um tanto quanto exagerada. Considero o Rondon uma "lição de vida e cidadania", assim como se propõe a ser.